domingo, 15 de setembro de 2013

O INCONSCIENTE E A MEDITAÇÃO de Lisélia de Abreu Marques




O INCONSCIENTE não é um lugar, não é a parte debaixo do iceberg, nem está separado do que está consciente por uma linha imaginária. Ele está em toda a parte, dentro e fora de você, te envolve como o ar que respiramos. É um estado de cegueira. Você olha pra ele e não vê nada. Assim como você não vê o ar, você não vê o inconsciente. Por definição o seu inconsciente é invisível para você.  A partir do momento em que você olha para o inconsciente e vê algo, aquilo deixa de estar inconsciente e passa a fazer parte do universo consciente. Você toma consciência daquilo.
             O inconsciente é particular. O que é inconsciente para você pode aparecer em letras garrafais, piscando em neon e com todas as cores para todas as demais pessoas. Seus amigos podem ver, sua família pode ver, até o caixa do supermercado pode estar vendo um conteúdo que só você não vê. E podem te dizer, te contar. O que acontece, na maioria das vezes, é que você não só não acredita neles, como até briga com eles por conta disto, negando o que dizem. Lembre-se, a cegueira é sua. O que não impede que outras pessoas que tenham esse mesmo ponto cego se unam e passem a defender o mesmo ponto de vista, no caso, ponto de não vista que você. Vale lembrar que a ignorância é um fator de inconsciência, assim como o preconceito.
Como aqueles espelhos de observação que de um lado é espelho e do outro é vidro transparente, você não vê o que está inconsciente, mas isso não significa que você não é visto tanto pelos outros, como por suas partes inconscientes. Se por um lado você reconhece uma parte sua preguiçosa, desleixada e bagunceira que se depara com uma parte trabalhadora e organizada, acontece, muitas vezes, de não reconhecermos partes nossas que condenamos, que não são socialmente aceitas, que são doentes demais ou que nos causam vergonha ou culpa. Isso não quer dizer que estas partes não nos considerem ou deixem de nos ver. O fato do Eu não ver, não significa que o inconsciente não esteja vendo.
 Costumamos chamar de EU toda aquela parte da gente que sabe que faz parte da gente, que na paz ou no conflito está sendo vista, que marca presença. Consideramos EU a parte que quer dormir até mais tarde e a que quer levantar cedo para estudar, a parte que quer comer até se fartar e a parte que quer fazer dieta, a parte feliz e a parte triste. O Eu engloba tudo o que está consciente, mas não reconhece como parte de si mesmo, o que está inconsciente. O inconsciente é uma parte não vista, não reconhecida de nós mesmos. Pode ser uma memória traumática que sumiu, pode ser um desejo sufocado, uma dor emocional que não consigamos lidar, um medo paralisante. Para o inconsciente vai tudo aquilo que não queremos ver. Cobrimos os conteúdos desagradáveis com um manto de invisibilidade até nos esquecermos que um dia existiram. Sim, o que hoje é inconsciente, um dia pode ter sido consciente.
  Não só de coisas ruins é feito o inconsciente. Um talento não desenvolvido, uma profissão não incentivada, um recurso emocional armazenado... está tudo lá. Potenciais e mais potenciais aguardando para serem convocados.
  Da mesma forma que o seu apêndice sempre existiu inconsciente para você, no dia em que ele fica doente, passa a ser a parte mais importante da sua vida.  Assim, também, uma parte sua inconsciente para o seu Eu pode, de uma hora para outra, vir a consciência gritando para ser vista e curada. Partes sufocadas, partes banidas, rejeitadas que criam recalque, raiva, dor vão se somando e adoecendo. Estas partes, enquanto inconscientes, não vistas pelo Eu, acabam por boicotar, atrasar e segurar você com relação a um desejo consciente. Podem adoecer seu corpo com dores inexplicáveis, podem deprimir você, levar você à falência, provocar acidentes, causar um câncer ou infarto, podem até matar você através do suicídio ou das drogas. Porque o fato de você não ver uma necessidade, não significa que ela não exista. E precisa ser sanada. 
                   Quando crianças temos o chamado “pensamento mágico” onde acreditamos ter poder sobre os eventos. Alguns adultos têm uma versão distorcida desse tipo de pensamento, acreditando, por exemplo, que se não forem ao médico, evitarão descobrir estarem doentes, como se não saber, fosse o suficiente para permanecerem sadios. Assim fazemos com muitas partes de nós mesmos. Guardamos em alguma gaveta e esquecemos delas lá dentro por muito tempo, até que elas apareçam como fantasmas cobrando saúde.
 Cabe falar aqui em Consciência do Ego e estados de consciência independentes. Sugiro que a Consciência do Ego, a consciência do Eu estabeleça a ligação entre os muitos estados de consciência. Estados de consciência são consciências apartadas, não unificadas ao Eu. Por não estarem integradas, vem a si próprias como uma unidade autônoma e agem como tal, assim como o Ego faz em relação a estados de consciência superiores.  Por este ponto de vista podemos sugerir que há dentro de uma pessoa, muitas "pessoas" diferentes, muitos estados de ânimo, muitas vozes diferentes que precisam ir se integrando umas às outras e recobrando a unidade. Uma maneira de favorecer esse processo de integração é fechando os olhos para ouvir melhor, voltando nossa atenção para dentro de nós mesmos, ficando em silêncio e ouvindo todas as nossas vozes falando. Num primeiro momento é um burburinho danado, lembranças, programas de TV, músicas, conversas, tudo continua ressoando dentro da nossa mente, fazendo eco. Se resistirmos à vontade de bater papo com a nossa mente, se ficarmos em silêncio, dando o exemplo, ela começará a silenciar também. Então poderemos ouvir uma voz que vem de mais longe, que não vem da mente tagarela e agitada do dia a dia. Vem de longe, do subconsciente, do inconsciente, vozes que precisam muito ser ouvidas e acolhidas, vozes sofridas de partes de nós mesmos que esperam há muito tempo para serem resgatadas, libertadas, integradas, curadas e reconduzidas à Unidade.
O INCONSCIENTE não é um lugar, o inconsciente é um estado de cegueira e a MEDITAÇÃO é uma maneira de, através da audição, voltar a ver.

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